domingo, 22 de janeiro de 2017

A condição dos presídios, revela nossa miséria social


Ultimamente, o Estado brasileiro vem deparando com suas mazelas antigas, um sistema prisional que implora urgentemente por uma intervenção estrutural, não só nos presídios, mas também no sistema jurídico criminal como um todo. Essa consciência da necessidade da reforma no sistema carcerário, nos veio a tona após as últimas notícias, estampadas nos jornais, das mortes de presos degolados por facções rivais nos presídios, uma selvageria impressionante, sendo mais de 130 mortos em menos de um mês, porém já era esperada desde o massacre no Carandiru com 111 mortos, onde seus autores estão livres sem condenação até hoje.
Ao ouvir algumas pessoas conversando a respeito, tive que entrar no debate. Estava num banco, com a senha na mão, aguardando para ser atendido no caixa, sentado numa poltrona, ao meu lado um senhor mais velho, calvo, de óculos, corpulento, com um jornal na mão, e um jovem, depois vim a saber que era seu sobrinho, quase da minha idade, alto, magro, pele clara, com sorriso maroto
O velho comentava a respeito das mortes trágicas nos presídios, da postura das autoridades, da desordem, e criticava como era absurdo o que acontecia no país. O rapaz ao seu lado só concordava, as vezes acrescentava alguma coisa, ficava mais ouvindo o seu tio argumentar sobre os acontecimentos. Quando terminou seu último comentário, lhe indaguei:
- E se houvesse um tratamento realmente humano e justomelhoraria essa situação? Uma jurisdição que seguisse a constituição e seus princípios basilares, com julgamentos imparciais (independente da cor, renda, e origem do investigado ou do réu); com direito ao devido processo legal; com direito a presunção de inocência ao acusado; com o direito a ampla defesa; com direito a um advogado àqueles sem condições financeiras; e prender só no último caso, como em crimes hediondos ou quando houver realmente risco a sociedade. Além disso, poderia reavaliar todas as prisões, pois conforme pesquisas cerca de 40% dos presos são provisórios e não foram julgados sequer na primeira instância, além de presos com tempo vencido da pena, e outros casos em que a pena pode ser convertida em prisão domiciliar ou em outras penas mais brandas. Assim, aliviaria o super lotamento nas celas, não obstante, com a grande demanda por vagas, haveria necessidade de construir mais presídios, e redistribuir os detentos, para dar uma condição mínima de dignidade para eles, e incluir nos presídios áreas de alfabetização e de aprendizagem profissional, além de trabalho assalariado, lógico sendo descontados os gastos pela capacitação, pelos materiais, etc. Logo, os presos poderiam ajudar seus familiares com a renda ou guardar numa poupança para usar quando sair da prisão, como na abertura de um negócio próprio.
Após ouvir o meu questionamento em silêncio, o velho me encarou durante alguns segundos, virou o rosto, e respondeu:
- Não sei se resolveria. Pois, com certeza haveria muita dificuldade na implantação... mas comparado com o que existe hoje, se conseguisse ser implantado seria uma imensa evolução...
- Não seria possível, ocorreria uma grande demanda de novas prisões! Uma voz saiu ao lado do velho, era seu sobrinho. Eu fiquei surpreso, e mais ainda curioso com a sua resposta. Ele continuou:
- Porque se você der uma condição digna de vida para os presos, lembrando que na sua maioria são pobres e analfabetos, eles possuirão moradia (mesmo sem liberdade de sair dela), alimentação (mesmo não sendo das mais nutritivas e saborosas), segurança (pelo ao menos dos perigos externos), saúde (mesmo precária) e ainda trabalho (mesmo com salário baixo). Pois, quantas famílias vivem na miséria, em condições precárias, vivem de ajuda, sem acesso a educação, sem empregos ou em sub-empregos como semi-escravos, muitas sem moradia... Então, essas pessoas serão influenciadas inda mais a entrar no mundo do crime, sabendo que sua punição será uma vida digna, pois a liberdade eles já não possuem mesmo...
Soou um bipe, olhei para o monitor, era o número da minha senha, levantei e fui para o caixa depois de despedir dos meus interlocutores. No trajeto até chegar ao caixa fiquei pensando, e percebi a raiz do verdadeiro problema do nosso sistema penitenciário...






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